quarta-feira, 29 de junho de 2011

Encanto de Curió

Era uma vez uma menina que morava na Rua bem te vi, no interior da Bahia,e todo dia chegava na sua varanda de pastilhas verdes e brancas, olhava para o telhado vizinho, cheio de telhas quebradas e observava um curió que só cantava em cima da mesma telha quebrada. A menina perguntou a sua mainha porque na sua varanda bonita não tinham pássaros cantarolando,e a mãe respondeu que era porque ela ficava esperando e não saia de lá. " Passarinho é bichinho assustado minha filha vai pra vida que o curió vem". A menina viajou para as festas de São João e esqueceu do curió da rua bem te vi. Numa manhã linda ,enquanto se arrumava para ir à escola, o momento mágico... Ele estava na pontinha da beirinha da varanda, e ela só via a silhueta pois estava contra luz. Ela observou encantada e deslumbrada o gogó do minúsculo passarinho subindo e descendo enquanto seu biquinho abria e fechava .Era o canto mais doce e tocava em algum lugar dentro dela. Ela esfregou os olhos e sussurrou pra mãe..." minha mãae...ô minha mãe,venha ver que coisa mais linda...ele veio cantar pra mim. A mãe com um tom de voz árido e sem poesia disse" garota abestalhada, passarinho canta pra qualquer um ,em qualquer lugar...desse da lua menina e vai pentear esse cabelo, ta parecendo um pica pau".
Pela primeira vez a menininha não deu ouvidos pra mãe e mudou desde então,  ela aprendeu a usar o olhar poético, a  sonhar e acreditar que era especial.
Ela cresceu sabendo que passarinho só canta pra quem sabe se encantar com o inesperado.
Virou escritora e até publicou um livro de poesias. Escrevia cada vez que sua alegria ficava do tamanho do gogó de um curió.

terça-feira, 21 de junho de 2011

Rio do meu Baú

Rio… que mesmo sem risos me encanta,trazendo lembranças da infância em Paquetá.
Lembro das tardes de maça do amor no Tivoli Park…
…cinema com cheeseburguer no shopping…
…patinação no gelo,matinês coca e guaraná.
Na colônia de féria eu nascia gente grande,cuidava de mim e às vezes tentava cuidar da minha irmã. Época de crescer,época de aprender a ser…
Quantos banhos de mar em Grumari…
Viagens tamanho família,sorvete o dia inteiro,marquinha de maiô…
Festa do pijama na vizinha,carregando travesseiro equipado com escova de dente e camisola e no pescoço a chave de casa…o crachá da liberdade pré-adolescente.
Eu me lembro das brincadeiras de pique…pique tudo…tinha até o tal de pique tá…
Lembro das chatices de criança bullying,dos tímidos inteligentes,das avançadinhas,as legais,as mal humoradas sentimentais e dos mais novos encrenqueiros. Sempre tem um que dá trabalho pro irmão mais velho.
Baú que quase não fecha calça meus pés quando treme o chão. Lembrar da infância boa estica os cantos da boquinha triste,devolve o soninho gostoso e deixa o dia seguinte a melhor pista pra aterrissar.



Protesto da garrafa vazia

Nenhuma mensagem na garrafa,nenhumazinha se quer…
Eu desisto de esperar…digo isso com lágrimas nos olhos…
Não…não é TPM não…
Tenho toda razão, afinal ,quem não espera uma mensagem de carinho,um sinalzinho de fumaça, uma expressão de bem querer? …Eu to cansada,irritada e chateada
Quem disser que não espera encontrar a sua garrafa recheada,é gente estranha…é bom desconfiar. Protesto contra todas as garrafas cheias de ar…
Até o gato…esse bicho com fama de independente… espera um carinho. Essa mania que ele tem de se esfregar nas coisas é carência,é falta de mensagem na sua garrafinha
Criança que não ganha carinho, não se sabe importante e vai viver de qualquer jeito, com qualquer um,em qualquer lugar, sem saber onde buscar…e aí meu caro adulto esperto e esclarecido ela vai aprender por tentativa e erro.
…mas não é essa a questão…meu protesto não é simplesmente a favor das crianças abandonadas nos plays maravilhosos, estimuladas pelas melhores babás,mas á favor de todas as garrafas que esperam um pedacinho de papel com palavras de amor.
A minha ta aqui na minha mão e eu resolvi escrever cartinhas de amor para mim e colocar dentro…jogo no mar ,mas sempre deixo todas amarradas…depois de alguns dias eu finjo que não lembro de nada e me alegro em encontrar as garrafas cheias de cartinha. To sozinha nesse barco,é preciso ser criativa…
Por que as gaivotas nunca pousam no meu mastro?
…acho que elas têm problemas para confiar. Qual o problema do meu mastro, até coloquei um tecido macio para elas se sentirem mais seguras…
…é isso que fazemos quando estamos em terra firme…preparamos a base para o outro ficar e se o outro não fica logo pensamos que ele tem dificuldade para se vincular.
Que dilema! O que fazer então?
No mar garrafas vazias, no céu gaivotas medrosas e arredias,dentro do barco…a mesma vela, o mesmo leme,o mesmo chão,o mesmo cheiro de madeira com maresia...
O que me resta?
Navegar…

domingo, 12 de junho de 2011

Terra firme de marujo

Gaivota na proa
Terra à vista
Alivio do olhar
Pássaro pouso repentino
Mensagem na garrafa dos sonhos
Sombra e água doce
Conforto, conquista
Tantas coordenadas
Terra á vista
Marujo dorso queimado
Sede de chão ,solo firme
Tantas ondas, tempestades
Maré mansa ...suspiro
Terra à vista
Descanso , recolhimento
Noite de lua cheia
Reverência... calor de fogueira
Todos os sonhos, novos sonhos
Amanhecer de marujo tem concha na sola do pé
Âncora recolhida ,velas caçadas
Rumo traçado
Gaivota de pouso sutil, Terra de bravos
Que bons ventos o levem marujo gentil

terça-feira, 7 de junho de 2011

O sorriso da lua laranja

Tem coisas repentinas que se apresentam aos sentidos desavisados só pra mudar a intenção,a direção,a emoção…
Sentia um embrulho no estômago, uma estranha irritação,suspiros melancólicos…
Seria o medo de voar?
Seriam os pensamentos barulhentos e ansiosos planando com as térmicas de saudade?
Não sei…
O fato é que… quando estava saindo do banheiro feminino um homem entrou por engano… inesperado…cômico
Em um segundo minha tensão foi atravessada por uma cosquinha engraçada…uma tímida vontade de rir. A atitude do cidadão ao entrar confiante e sua expressão desconcertada ao ser barrado…por mim… presentearam-me com um semblante mais leve e uma disponibilidade para o próximo minuto.
Um pão de queijo fresquinho e uma xícara média de café com leite…cremoso… o grito inadequado da atendente “olha o misto” quebrando o silêncio erudito da espera de quem vai…
A idéia que surge, os dedos saltando de uma tecla para outra, chamam o olhar perdido pra brincar…brincar de transformar sensações em histórias…
Não contava com o assento 23c do avião, mais uma vez fiquei longe da minha querida fileira 5…
Acho que o medo é coisa de gente rígida,controladora,que tem mania de esperar…
Turbinas,sons,vibrações, a espera… os pensamentos explosivos lançando estilhaços de antecipação para todos os lados…desconfortos conhecidos…
Estava indo tudo bem…e eu me surpreendi com um desejo estranho… desejei a turbulência
Estava tudo tão calmo… e essa idéia me surgiu, uma turbulência seria mais fácil de lidar do que essa tranqüilidade imprevisível.
A tensão preenche.Para alguns é o recheio de sempre… não pensei em nada novo…vai esse mesmo.
Isso tudo em poucos minutos durante a subida do avião…
Fui tomada por uma curiosa prontidão…estava livre para aceitar tudo dos próximos minutos,horas,vida inteira… posso ter perdido uma pele…
…igual cobra que só muda de pele se continuar rastejando… deve doer,ou arder
…eu que sou humana sinto angustia,melancolia,medo…ardências emocionais,dores existenciais
Olhei para o lado e vi que meu companheiro de fileira dormia confortavelmente e sem alternativa aceitei minha inquietação…
Foi no segundo depois da aceitação que ela sorriu pra mim, única, sarcástica,cúmplice e pacífica…a lua laranja em forma de sorriso largo…incrível!
Ousada beleza, soltou meus nós,dissipou minha tempestade e gentilmente embalou meus olhos assustados.
Eis uma boa lição !
Não controlo nada !
Que bom!

Sei lá quando

Ansiedade é um querer que o dia amanheça conhecido
È querer conhecer o que ainda não conheço,sem ao menos esperar o amanhã chegar.
È tentar adivinhar o que o outro está pensando, prevendo os pensamentos mais frios e confusos.
Que ousadia! O outro pode não estar pensando em nada.
Talvez esteja fazendo contas de cálculos apertados ou planejando a próxima viagem
Ansiedade é atrever-se adivinhar  o que o outro esta sentindo ao invés de desfrutar do sentir-se vivo, pronto para o imprevisível.
Ansiedade é um hábito de preencher o presente com um monte de histórias que nunca vou viver e esquecer de viver essas páginas que deslizam sob meus pés, me desequilibrando e anunciando  que o aqui e agora não é tão seguro quanto o futuro que invento,mas é nele que sinto os cheiros,os sabores,os macios,os abraços, o coração que pulsa,os pelos que arrepiam,a vontade de ir ou ficar e todas as emoções ariscas que fazem o corpo vibrar.